Com a constante e cada vez mais rápida evolução tecnológica pela qual o mundo vem passando durante os últimos anos, a sociedade acaba mudando seus hábitos, formas de comunicação e maneiras de se relacionar. Fenômenos relativamente recentes, como a internet e a difusão de aparelhos celulares, inclusive com conexões com a rede mundial de computadores, passaram a interferir diretamente na formação de crianças e adolescentes. O fato é que os computadores estão invadindo as casas e as salas de aula, mas será que pais e professores estão preparados para lidar com isso? Alheias a essa transformação, famílias e escolas não conseguem, em muitos casos, direcionar e orientar os jovens para o uso saudável e pedagógico das novas ferramentas, que podem servir como importantes canais de aproximação entre estudantes e aprendizado, se bem utilizadas. Assim, torna-se cada vez mais comum casos de cyberbullying, invasão de privacidade, exposição pública da intimidade ou de momentos constrangedores, roubo de identidade e, até mesmo, de excessiva perda de tempo navegando por diferentes sites e redes sociais, deixando os estudos de lado.
Dados do Comitê Gestor da Internet no Brasil mostram que enquanto a média mundial de iniciação em redes sociais é de 12 anos, no Brasil é de apenas 9. Além disso, informa que 39% das crianças usam a internet sem a supervisão de adultos e que 20% delas aprenderam a mexer no computador sozinhas. Da mesma forma que apresenta uma série de variáveis que precisam ser consideradas para que não cause efeitos nocivos, a internet e as demais ferramentas tecnológicas também podem servir para estimular o aprendizado entre crianças e adolescentes. Para isso, entretanto, é preciso que haja uma educação digital capaz de orientar os usuários e evitar danos que, às vezes, podem ultrapassar os limites do mundo virtual. O assunto preocupa tanto que, no último dia 15, foi realizado, na Fundação Getúlio Vargas (FGV), o Fórum Internacional de Cidadania Digital, especificamente para discutir os desafios do uso da internet na educação. O evento foi uma parceria entre a FGV Projetos e TelasAmigas, instituição que atua no fomento ao uso seguro das novas mídias no ensino de crianças e jovens na Espanha e América Latina. Nas mesas de debate, os convidados discutiram a utilização segura e sustentável das infraestruturas digitais. Entre os temas abordados estavam Educação e Internet com Segurança, Cidadania Digital para a Infância e Adolescência, Proteção à Internet e o Futuro da Cidadania Digital.
Especialistas defendem orientação para uso adequado - O secretário de Estado de Educação do Rio de Janeiro, Wilson Risolia, participou do encontro. Na ocasião, ele apresentou dados da pesquisa encomendada pela secretaria ao Instituto Mapear, em dezembro de 2011. Os dados mostram que 92% dos alunos entrevistados têm acesso frequente a computadores com internet. Desses, 68% acessam em casa e apenas 3% nas escolas. A pesquisa também mostrou que o baixo nível de escolaridade e a falta de uso da internet por parte dos pais dificultam a orientação aos estudantes, em casa, sobre o assunto, já que os próprios responsáveis não têm noção dos perigos causados pelo mau uso da rede. De acordo com | Risolia, o jovem se conectou, mas a família não. Além disso, o problema também passa pela formação dos educadores, que muitas vezes não os prepara adequadamente para lidar com essa situação. "Na verdade, fala-se bastante em inclusão digital, mas pouco em Educação Tecnológica. Investiu-se muito em equipamentos e no ensino sobre como usar as ferramentas básicas, porém falta instrução a respeito do uso correto da internet. Acho fundamental chegarmos até as famílias. Não vejo outra forma que não seja a comunidade escolar trazendo a família para tratar o assunto", afirmou.
Na opinião do secretário, tão importante quanto incluir é saber formar os usuários para o uso adequado da rede. Para isso, em 2010, a Secretaria de Estado de Educação (Seeduc), em parceria com o Ministério Público do Estado do Rio (MP-RJ) e a Safernet, realizou uma capacitação para 3.839 professores, com formação em "Promoção do uso responsável e seguro da internet". Paralelamente, a Seeduc vem promovendo uma orientação pedagógica para os docentes. No entanto, reconheceu que só isso não é suficiente, já que as transformações acontecem muito rapidamente. "Embora seja um bom número, pois foi o começo, ainda não é o bastante para melhorar o quanto é necessário", disse, ressaltando que é preciso desenvolver um projeto de Educação Digital, que englobaria lições de segurança e privacidade, cidadania e ética digital, com palestras para grupos (escolas, professores, pais e alunos) com foco na necessidade de cada um. "A capital é mais conectada que o interior. Na hora que analisamos proficiência, as 100 piores escolas estão na capital e as 100 melhores no interior. Portanto, não podemos afirmar que quanto mais conectado, melhor o desempenho, pelo menos da maneira que é hoje", completou.
Durante o Fórum, Rafael Parente, subsecretário de Projetos Estratégicos da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, apresentou a Educopédia, uma plataforma de aulas digitais de cada disciplina, com material de suporte aos professores, planos de aula, jogos pedagógicos e vídeos, com o objetivo de tornar o ensino mais atraente para crianças e adolescentes, além de instrumentalizar o professor e ser mais uma alternativa para o reforço escolar e para os alunos que faltaram às aulas ou que não compreenderam o conteúdo ensinado. "O que acontece na escola é reflexo da sociedade. Precisamos ter uma educação voltada para os valores. Nesse sentido, também é objeto da escola falar e formar para o uso da tecnologia, pois já faz parte da nossa vida. O uso de ferramentas como a Educopédia motiva e estimula professores e alunos. É uma maneira segura e atraente de ensinar e aprender", comentou.
Para Bianca Mota de Moraes, Promotora de Justiça de Proteção à Educação do MP-RJ, a tecnologia tornou-se ferramenta essencial para o exercício da cidadania em nossa sociedade e está completamente ligada à área educacional. De acordo com ela, além de disponibilizar a tecnologia, é preciso direcionar seu uso de maneira que contribua para a evolução e para o crescimento do aluno. "O relacionamento entre professores e estudantes também mudou e precisa | ser ressignificado. Acho necessário intensificar a formação docente para tornarmos a tecnologia interessante. A questão é de que forma ela pode ser útil para as crianças e jovens adquirirem conhecimentos e cultura", falou, reforçada por Ana Beatriz Lopes, conselheira da Telas Amigas. "No momento, não basta apenas comprar tecnologia. É necessário capacitar e investir em educação com uma perspectiva diferente. Temos que abrir um pouco a cabeça e tentar nos aproximar das novas gerações", disse. O educador Cláudio Mendonça acredita que as redes sociais possam ser bons ambientes para a difusão do aprendizado, com os usuários compartilhando coisas interessantes e estimulando o estudante a pesquisar mais sobre o assunto. Além disso, de acordo com o educador, também pode servir para a valorização dos professores. "O ser humano precisa de reconhecimento. No passado, era com jornais. Hoje, é na internet. Já que não valorizamos com salários, poderíamos pelo menos um reconhecer os bons professores. O mesmo vale para os alunos que conseguiram avançar. É absolutamente possível utilizar as redes sociais para isso", analisou.
Opinião: qual a maior dificuldade para o uso da internet na escola? - "A maior dificuldade para um professor trabalhar com a internet e outras tecnologias em sala de aula é, justamente, o fato de que nem todas as escolas estarem equipadas com esse recurso. Não adianta colocar apenas para alguns alunos e para outros não. Teria que ser uma rede de computadores capaz de alcançar todos os estudantes. Além, é claro, de uma segurança para que os equipamentos não sejam roubados. A maioria dos professores estão capacitados para trabalhar dessa forma, o que falta é incentivo. Por exemplo, quando você entra no magistério, não é convidado a fazer cursos de atualização. O que acontece é que temos que fazer por conta própria." Rogério Bastos. Professor da rede estadual do Rio de Janeiro
"O problema é a falta de internet. Infelizmente, essa é a grande realidade das escolas. Fora isso, outro problema é quando levamos os alunos ao laboratório de informática, porque eles só querem entrar no Facebook ou no Orkut. Então é preciso motivá-los para as atividades pedagógicas também. Porém, quando usamos a Educopédia dentro de sala, o retorno do estudante é muito positivo. Permite que os professores deem sua aula normal e depois utilizem um conteúdo interativo. Então, dá um resultado bem legal." Márcia Roberto da Silva. Professora da rede municipal do Rio. "Temos duas principais dificuldades. A primeira é o fato de que os professores ainda não sabem lidar pedagogicamente com a internet. O segundo é a questão da infraestrutura. Às vezes, estamos na parte mais importante da pesquisa e a conexão é interrompida. Sofremos bastante com isso. De resto, é normal. Trabalho com educação infantil e os alunos estão mais do que acostumados com as tecnologias. Alguns, inclusive, entendem mais que os próprios professores. Passamos filmes, mostramos figuras, promovemos jogos, pesquisas. É uma viagem que fazemos com eles sem precisar sair da escola." Maria de Fátima Mendes. Diretora de uma escola da rede municipal do Rio |
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